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Traumatologia forense

História

Após o austríaco Hans Groß publicar seu livro Handbuch für Untersuchungsrichter als System der Kriminalistik em 1893, uma nova era da criminalística iniciou-se com a definição de cena do crime e da coleta de evidências, notadamente para confrontar decisões judiciais tendenciosas e pouco esclarecidas. Seu manual introduziu a ciência formal no direito.

Princípios

Análise

Princípio básico da atividade pericial, que é o apoio na metodologia científica.

Descrição

A linguagem técnica favorece a descrição precisa.

Troca ou de Locard

Todo contato é uma troca de materiais e energias.

Individualidade ou de Kirk

Tudo pode e deve ser individualizado em termos periciais.

Lesões e feridas

A abertura tecidual ao meio é chamada de ferida. As alterações teciduais, mesmo que não interrompam a continuidade, são chamadas de lesão.

Para entendimento geral, a classificação de Borri foi a mais aceita pela doutrina, em que agrupam-se as lesões de acordo com a energia causadora.

Lesões elementares em traumatologia forense

Rubefação

Caracteriza-se por congestão circulatória repentina e momentânea de uma área de alguns tecidos como o cutâneo e muscular quando traumatizada por instrumento contuso, caracterizada por vermelhidão efêmera e fugaz.

Equimose

Espectro equimótico de Legrand du Saulle
Cor da equimose Lapso
em dias
Hemocomponente
predominante
Vermelho escuro 1 Hemoglobinas
Violeta 2 ao 3
Azulado 4 ao 6
Verde escuro 7 a 10 Hemossiderinas
Verde amarelado 11 ao 12 Biliverdinas
Amarelado 12 a 17 Bilirrubinas
Desaparece - 18 a 21 Vasos íntegros

As equimoses podem se formar em local diverso do trauma, como ocorre na fratura de base de crânio com surgimento do sinal de Guaxinin ou de Zorro. Thoinot dizia que a equimose era uma prova irrefutável de reação vital.

Outros tecidos diversos da pele podem ter cronologia de surgimento e desaparecimento das lesões equimóticas muito diferente da descrita por Legrand du Saulle. A conjuntiva ocular e.g. pode apresentar equimose em aspecto avermelhado fixo até seu desaparecimento. Hygino também cita o escroto como região de progressão crômica diversa das equimoses em geral.

Equimonas

Equimose extensa, de tamanho não habitual.

Hematomas

Extravazamento sanguíneo para neocavidade.

Bossa

O hematoma formado sobre plano ósseo, vulgarmente chamado de “galo”.

Sugilações

A equimose formada pelo aglomerado de pequenos grãos. Um exemplo é o “chupão”.

Petéquias

São pequenas equimoses, com o tamanho de cabeça de alfinete.

Sufusões

Também conhecida como equimoma. Há uma hemorragia mais extensa, de tamanho variado.

Víbices

São lesões com assinatura, apresentam a forma de estrias, duas linhas paralelas.

Outras lesões específicas

Sedenho

Os projéteis e os agentes vulnerantes penetrantes na pele podem livrar-se de entrar nas quatro cavidades do corpo humano, sejam elas a abdominal, a torácica, craniana e raquiana. Nesses casos, a ferida é dita em sedenho, fenômeno comumente ocorrido em casos de “bala giratória”, quando o projétil faz trajetos curvos livrando as cavidades.

Chuleio

Um mesmo projétil pode transfixas diversas partes do corpo, tornando o caminho um trajeto em costura de mais de um tecido, chamado chuleio.

Lesões intra e postmortem

Tourdes afirmava que numa janela de 12h, estando 6h antes e 6h após a morte, as lesões não podem ser dirimidas quanto a ocorrência intra ou postmortem.

Prova de Verderau

Consiste em comparar a relação existente entre as hemácias e leucócitos da lesão suspeita, tomando como parâmetro esses elementos figurados do sangue de outra região qualquer do corpo. Se a relação dos glóbulos brancos e vermelhos se equivale nas duas contagens, diz-se que a lesão foi produzida após a morte. Se a primeira contagem é superior à segunda, conclui-se pelo diagnóstico de uma lesão in vitam.

Energia mecânica

Lesões contusas

Em breve.

Lesões cortocontusas

Mordedura

Em breve.

Lesões perfurocontusas e puntiformes

Em breve.

Lesões incisas

A lesão decorrente da pouca pressão e grande capacidade dissecante é chamada de incisa. Este termo esteve reservado em boa parte da doutrina para as lesões em cortes produzidas pelo médico durante cirurgias ou procedimentos. Porém, seu uso amplo se refere a todas formas de resultado cortante dos instrumentos de gume, quando usados na sua maneira tradicional, deslizante, com pouca ou proporcionalmente pequena força.

Leis de Edouard Filhós e Langer

Lesões causadas por arma de fogo

A balística se subdivide em balística interna, externa e terminal. A interna estuda os mecanismos de disparo de projétil, a externa se debruça sobre a viagem dos projéteis e a terminal ou de efeitos se preocupa com a interação com os alvos. A traumatologia se importa com a balística externa e principalmente a terminal.

Trajeto e trajetória

Trajeto é o caminho que o projétil faz no interior do corpo humano, enquanto que trajetória é o percurso entre a arma e a vítima. No trajeto, importa ao legista primordialmente entender como o projétil se comportou antes de acertar o alvo. Os moviemntos de nutação, rotação e báscula ou precessão são os de relevância, conforme ilustro abaixo.

NutaçãoRotaçãoPrecessão

Efeitos primários e secundários do tiro

Os efeitos primários decorrem da ação do projétil e independem da distância do tiro.

Já os efeitos secundários resultam dos tiros encostados ou à curta distância, da ação dos gases, de seus efeitos explosivos, de resíduos da combustão da pólvora e de microprojéteis.

Coeficiente balístico

Termo exato definidor do grau de dano causado pelo projétil em termos de sua massa $m_{p}$(g), sua ponta $p_{p}$(mm) e seu calibre $c_{p}$(mm). Assim, $$ C_{b} = \frac{m_{p}}{p_{p}c_{p}} $$

Disparo a grande distância

O tiro a distância causa apenas os efeitos primários.

Os orifícios de entrada normalmente possuem diâmetro menor que o do projétil, forma arredondada ou elíptica, suas bordas são viradas para dentro, bem como contam com algumas características:

Os três primeiros sinais acima decorrem da passagem do projétil pela pele, ou seja, são efeitos primários do tiro. Aparecem somente nas lesões de entrada, porém, sua ausência não indica que o orifício é de saída, como ocorre nos casos em que o tiro é dado com um anteparo, eg. travesseiro, não haverá orla de enxugo, uma vez que o projétil vai ser limpo antes de atingir a vítima.

Disparos a curta distância e à queima roupa

A distância do disparo é da ordem do cone de explosão ou da faixa de expansão dos gases.

A doutrina está em progressivo abandono do termo à queima roupa. França ainda traz que, em se tratando de disparos à cerca de 10cm, este seria um termo adequado.

O tiro a queima roupa ocorre com efeitos primários e secundários além do possível chamuscamento. Já o tiro de curta distância tem efeitos primários e secundários, sem chamuscamento.

Muitas vezes, é míster ao perito indicar se o disparo teve alguma chance de ter sido realizado a curta distância. Nestes casos, a queimadura direta do cone de explosão é o mais óbvio dos sinais e a tatuagem proveniente da pólvora incombusta o menos nítido. Se há chance do disparo ter sido efetuado a distância compatível com a projeção dos gases e particulado, algum fragmento da carga estará incrustado abaixo da epiderme. Esta ordem de obviedade é importante porque esclarece crimes complexos.

Fratura ou lesão em fechadura

A lesão em buraco de fechadura se refere ao fenômeno do tiro obliquoamente incidente sobre o plano ósseo, causando entrada lateralizada do projétil que forma o orifício de entrada e um tunelamento subsequênte, geralmente ressaltando o osso, como em uma fechadura. Ocorre tanto em disparos de curta e longa distância, tendo maior relação com ângulo de entrada que com a energia per si.

Disparos encostados sem plano ósseo

O tiro encostado tem efeitos primários e características peculiares:

Em geral, nos ferimentos de tiros encostados, não há zona de tatuagem nem esfumaçamento.

Disparos encostados com plano ósseo

O orifício de entrada

Em breve.

O trajeto do projétil

O orifício de saída

Regra geral, as lesões de saída possuem forma irregular, borda reviradas para fora, maior sangramento, além de não apresentarem os sinais apresentados acima.

Há doutrinadores que afirmam que a lesão de saída pode apresentar uma orla de equimose se o tiro foi dado com a vítima encostada contra algum anteparo, por exemplo, no chão ou parede, pois, dessa forma, o projétil teria dificuldade para sair e acabaria gerando a escoriação.

Sinal de Romanesi

É a equimose em halo formada no orifício de saída quando há um anteparo posto contra a pele no local de saída.

Fenômenos diversos

O tiro encaixado

Trata-se de incomum possbilidade em que o último disparo resultou em projétil retido no cano que é empurrado por disparo mais atual e ambos são propelidos como projétil único ou separados. Podem, portanto, acarretar lesões diversas ou singular. Normalmente, a energia do disparo é menor.

Lesão óssea em fechadura

Colisões de projétil em ângulos tangenciais produzem uma entrada oblíquoa no tecido ósseo, deixando um caminho de entrada normalmente descrito como buraco de fechadura.

Orlas desalinhadas

As orlas equimótica, de esfumaçamento, de queimadura e de tatuagem podem ser de dois tipos quanto ao seu alinhamento:

Explosões

As explosões a.k.a. pelo neologismo blast se dividem pela lesão que causa:

Escoriações

A escoriação é o resultado da ação tangencial do instrumento contudente. Pode ocorrer em diferentes graus e extensão, a depender do instrumento em si, da energia e do tecido escoriado, porém, sua forma mais comum é da pele escoriada por superfície irregular, situação na qual as lesões são múltiplas, parecidas, com rastro linear que acompanha o movimento tangencial e hiperemia secundária.

Além disso, a epiderme é a única afetada, sem ferida real, pois a abertura da derme ou da hipoderme caracterizariam a lesão contusa.

Por fim, as escoriações não cicatrizam no sentido estrito e passam, sim, por reepitelização, não deixando cicatriz ou marca.

Lesões no pescoço

No esgorjamento é comum o achado de mosaico salpicado pulmonar.

O esgorjamento suicida pode apresentar o borrifo sanguinolento no espelho, revelando a angústia do momento final, também chamado de sinal do espirro sanguíneo de Bonnet.

Energia química

Os cáusticos podem ser classificados como:

Desidratante: ácido sulfúrico ou ventríolo, óxido de cálcio, hidróxido de sódio (soda cáustica em escamas) e hidróxido de potássio.

Oxidante: ácido nítrico, clorídrico, crômico, fênico ou fenol e nitrato de prata ou cáustico lunar.

Fluidificante: hidróxido de sódio (soda cáustica em solução), ácido acético ou etanoico e amônia ou amoníaco.

Coagulante: cobre, chumbo, mercúrio e sais de zinco.

Irritante: gás mostarda ou iperita (gases bélicos).

Lesões e feridas cáusticas

Ácido (branco sulfúrico, amarelo e otura cor…) e sais? - coagulação, ressecamento e endurecimento. Variadas cores. Bases (hidróxidos e amônia)- liquefação ou liquefacientes.

O diagnóstico diferencial das escaras produzidas in vitam ou post mortem é que após a morte, elas não têm propriamente a forma de escara, mostram-se apergaminhadas e de tonalidade marrom-escura. Sob o ponto de vista histológico, não apresentam reação vital através dos exames histoquímicos e histológicos.

Energia elétrica

Natural

Artificial

A eletroplessão mata por fibrilação ventricular.

A certeza de morte por eletricidade passa pela presença de pontilhado hemorrágico nos assoalhos ventriculares cerebrais, conhecidos por sinal de Piacentino, que, associado à marca elétrica de Jellinek, leva a um diagnóstico de convicção de uma morte por eletroplessão.

Piacentino também notou que ocorre intenso pontilhado hemorrágico nas regiões cervicais e dorsais e na face lateral do tórax em forma de micropápulas cianóticas.

Portanto, o encontro destes sinais corroboram fortemente para a causa de eletroplessão da morte.

Energia térmica

graph TD;
1(Termonoses) -- focal --> 2(Queimadura);
1 -- difusa --> 3(Intermação);
1 -- difusa por
energia solar
direta ou indireta--> 4(Insolação);

Queimaduras e geladuras

A gravidade das queimaduras focais se dá pela extensão. Há diversas classificações do chamado grande queimado.Em geral, chama-se de grande queimado o paciente com mais de 20% de superfície corporal queimada.

Veja em queimados.

Intermação

O encéfalo apresentava hiperemia e congestão das meninges; coração com consistência muito aumentada; pulmões com equimoses subpleurais e edema interno; notou, em outras vísceras, a presença de hipertermia interna e de grande quantidade de sangue no sistema venoso.

Insolação

A lesão difusa térmica causada pela exposição a intempérie solar é a mais grave.

Graus de queimadura

De acordo com a classificação de Lussena-Hoffman, a presença de flictena e bolhas na pele (sinal de Chamber) caracteriza a queimadura de segundo grau.

Energia ionizante

Úlcera de Roentgen

Irradiação da pele com pelo menos 12 Gray ou irradiação repetida com pequenas doses resultam em radiodermatite crônica após 2 anos ou mais. No centro atrófico da radiodermatite, há pouca circulação e inflamação crônica leva a ulceração central devido a trauma mínimo ou suprimento de oxigênio ao tecido inadequado. São caracterizadas por sua pobre cicatrização.

Classificação de gravidade nas lesões corporais

Primeiramente, a lesão corporal é o evento qualquer que ofenda a integridade física ou a saúde de alguém.

Portanto, para nosso escopo, interessa as avarias físicas contra alguém. Mas caracteriza-se lesão corporal também os insultos à saúde mental.

Gravíssimas, graves e leves

É gravíssima a lesão que acarreta:

É grave se o resultado da agressão causa:

E são leves todas demais lesões corporais.

Portanto, na gradação da gravidade de lesões corporais, opera-se por exclusão, primeiro das possibilidades gravíssimas depois das graves.

Perigo de vida

O perigo de vida foi uma feliz colocação do código penal que evitou a confusão comum deste termo. Caracteriza-se o perigo de vida pela real ameaça à vida, de forma concreta e possível. Jamais se deve admitir como perigo de vida as situações que partem da hipótese especulativa. Por exemplo, é um erro afirmar que uma ferida incisa no dedo indicador oferece perigo de vida já que uma infecção grave pode se alastrar como sepse e levar à morte. Já um traumatismo crâniano tem potencial efetivo real e imediato de causar a morte, a depender de sua energia e forma de ocorrência, configurando, este sim, um perigo de vida.

Autolesões, simulações e metassimulações

Autolesão é a a lesão causada e sofrida pelo mesmo agente. Quando tem o interesse particular de indicar falsamente crime a outrem, chama-se simulação. Quando o agente agrava em si mesmo lesão já existente, chama-se metassimulação.


Bibliografias

  1. FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. Rio de Janeiro-RJ: Guanabara Koogan, p. 1207, 2017.

direito · medicina · penal